quinta-feira, 29 de julho de 2010

Celebração da fantasia

Foi na entrada da aldeia de ollantaytambo, perto de Cuzco. Eu tinha me soltado de um grupo de turistas e estava sozinho, olhando de longe as ruínas de pedra, quando um menino do lugar, esquelético, esfarrapado, chegou perto para me pedir que desse a ele de presente uma caneta. Eu não podia dar a caneta que tinha, porque estava usando-a para fazer sei lá que anotações, mas me ofereci para desenhar um  pouquinho em sua mãe.
Subitamente, correu a notícia. E de repente me vi cercado por um enxame de meninos que exigiam, aos  berros,  que eu desenhasse em suas mãozinhas rachadas de sujeira e frio,  pele de couro queimado: havia os que queriam um condor e uma serpente, outros preferiam periquitos ou corujas, e não faltava quem pedisse um fantasma ou um  dragão.
E então, no meio daquele alvoroço,  um desamparadozinho que não chegava a mais de um metro do chão mostrou-me um relógio desenhado com tinha negra em seu pulso:
-Quem mandou o relógio foi um tio meu, que mora em Lima-disse.
-E funciona direito?-perguntei.
-Atrasa um pouco-reconheceu.
Texto retirado da página 39 do livro "Livro dos Abraços"  de Eduardo Galeano, editora L&PM Pocket

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